BIOPOLÍTICA E POLÍCIA SOBERANA: A SOCIEDADE ESCRAVOCRATA COMO CHAVE DE COMPREENSÃO DA VIOLÊNCIA E DA SELETIVIDADE PUNITIVA NO BRASIL

Autores

  • Maiquel Angelo Dezordi Wermuth Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS/RS; Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul - UNIJUÍ.

DOI:

https://doi.org/10.25192/issn.1982-0496.rdfd.v23i31262

Palavras-chave:

Biopolítica. Racismo. Seletividade. Violência policial.

Resumo

O presente artigo tem por objetivo analisar como a violência e a seletividade policial se perpetuam no Brasil a partir de suas origens no sistema escravocrata. O problema que orienta a pesquisa pode ser assim sintetizado: em que medida a sociedade escravocrata brasileira pode ser compreendida enquanto chave de compreensão da formação de uma polícia soberana, que detém, desde os primórdios de nossa história, o poder de vida e morte em relação à população subalternizada, evidenciando o comércio constitutivo entre violência e direito que caracteriza o estado de exceção? Parte-se da hipótese de que a gestão policialesca da miséria, no Brasil, remonta às origens da história do país, resistindo incólume às mudanças republicanas e ganhando fôlego durante o longo período ditatorial, sendo que, no curto período que marca o seu processo de redemocratização o país não assistiu a nenhuma alteração substancial nesse modelo. O texto encontra-se estruturado em três seções: na primeira, procura-se contextualizar as estratégias de controle da população negra no Brasil no período colonial e da incipiente República, por meio da utilização sistemática da violência; na segunda, procura-se analisar dados contemporâneos da violência e da seletividade punitiva contra a população negra/subalternizada do país, de modo a explicitar, na terceira parte do texto, a existência, no Brasil, de uma polícia soberana, tal qual a revelada pela filosofia agambeniana, e que evidencia de um modo muito claro a zona de indistinção entre e direito e violência que marca o estado de exceção. O artigo é perspectivado pelo método fenomenológico.

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Biografia do Autor

Maiquel Angelo Dezordi Wermuth, Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS/RS; Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul - UNIJUÍ.

Doutor em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS (2014). Mestre em Direito pela UNISINOS (2010). Pós-graduado em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul - UNIJUÍ (2008). Graduado em Direito pela UNIJUÍ (2006). Professor do Programa de Pós-Graduação (Curso de Mestrado em Direitos Humanos) da UNIJUÍ. Professor dos Cursos de Graduação em Direito da UNIJUÍ e da UNISINOS. Líder do Grupo de Pesquisa Biopolítica e Direitos Humanos no CNPq. Coordenador da Rede de Pesquisa Direitos Humanos e Políticas Públicas. Editor-chefe da Revista Direitos Humanos e Democracia (UNIJUÍ).

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Publicado

14-12-2018

Como Citar

Wermuth, M. A. D. (2018). BIOPOLÍTICA E POLÍCIA SOBERANA: A SOCIEDADE ESCRAVOCRATA COMO CHAVE DE COMPREENSÃO DA VIOLÊNCIA E DA SELETIVIDADE PUNITIVA NO BRASIL. Revista Direitos Fundamentais & Democracia, 23(3), 284–309. https://doi.org/10.25192/issn.1982-0496.rdfd.v23i31262